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Foto do escritorSonaira D'Ávila

Chegar em casa, um eterno movimento!

Atualizado: 28 de dez. de 2019


Um frio na barriga e a euforia do novo, de novo!

Não sei o que me espera. Nem na partida, nem na chegada.

E no meio dos dois, fico suspensa entre o oceano. Pairando acima das nuvens!

Tudo sempre em movimento e a gente começa a questionar certezas. Estes últimos dias desta minha temporada do Rio de Janeiro não foram diferentes. Muita coisa se desfazendo e organizando. Mas consegui, na verdade , conseguimos, porque aqui em casa, somos dois nesta Rota rumo sempre ao Sol. Me abasteci do mar, que me faz uma falta incrível e fiz meu estoque de sol salgado.

O verão foi intenso no Brasil este ano e o inverno na Alemanha chegou a bater -22 graus.

Mundos extremos.

Mas é do momento de transição que quero falar.

O Rio de Janeiro, desde que me entendi gente, foi a minha casa. Nasci em Porto Alegre e a família veio pro Rio quando eu tinha 5 anos. Logo, pouco de gaúcha tenho, mas carioca, carioca da gema também não foi.

De uns 15 anos pra cá o destino me deu asas pra migrar de novo, desta vez rumo a Alemanha.

Mas de forma diferente da primeira mudança que viemos inteiros, eu agora vivo no meio, por enquanto.

Meio ano em cada continente. Meio ano em cada cultura. Meio cá, meio lá. Nem bem parto, nem bem chego, por que já vou retornar.

O movimento passou a ser minha casa.

Do Rio pra cá na praia Vermelha

Photo by José Luís Figueiredo

Este estado de pairar “sobre" tem seus prós e contras. O grande desafio tem sido viver no Agora, seja ele onde for.

E a atenção a cada momento, que pode ser o último, está cada vez mais presente.

Estar num lugar pensando no outro é a grande cilada que tento evitar. O ápice desta viagem se encontra exatamente no meio, quando se acaba de partir e ainda não se chegou. O corpo pede pra chegar em casa, mas onde?

A transição- Um momento em que literalmente se fica tonto, fora do chão. Suspenso. Se desconecta do que ficou pra trás e se passa a ver de fora. Um momento fora do tempo e espaço.

Sim, o corpo chega na frente, e o delay não é só do fuso horário. A Alma com o resto vai chegando devagar. Parto do Rio no meio do Outono rumo a Primavera. Nesta época, as temperaturas quase se encontram sem os extremos. 20 graus é a média, perfeito! Mas o corpo ainda quente e “aberto” do calor tropical precisa se proteger mais. O decotes e roupas mais leves dão lugar a calças, meias, casacos já na ida pro aeroporto.

Pois bem, tô chegando na Alemanha, mais especificamente na Bavaria.

Leva um pouco menos de uma semana para conseguir de verdade "chegar". É preciso tempo para se entrar no fuso.

O olhos, o paladar, o intestino, a pele, tem seu ritmo próprio de reagir e se aquietar. Eu sempre preciso dormir muito nestes dias. E aprendi a respeitar este tempo.

E isso é especial, porque neste momento de reencontro posso me desprender do que era e posso rever, só neste momento, o que de fato é. A distância faz milagres.

Passa rápido e tenho que aproveitar.

Não só para valorizar este retorno, como para desapegar do que já não necessito mais.

É o momento que vejo como é único o por do sol seja em Ipanema ou nos Alpes, por exemplo. Mesmo tendo avistado diversas vezes na minha vida.

É o momento que valorizo os sorrisos e abraços de queridos, sejam na chegada ou na partida.

É o momento que me emociona ao ver o avião pousar em Salzburg com os Alpes nevados ao fundo e os campos de um verde novinho emoldurando a pista.

Vivo por aqui na fronteira da Alemanha com a Áustria. E este aeroporto pequeno é mais pessoal, quase que só meu.

Nos quinze minutos de carro até chegarmos em casa, vim revendo os campos, os bosques, as montanhas semi desertas, ouvindo os pássaros e os sinos das igrejas com a percepção ainda alterada, quase como uma meditação, um transe em que devoro tudo. Os pés ainda fora do chão!

Este momento é tão precioso…

Os pequenos momentos são de (re)descobertas e vão nos trazendo de volta pouco a pouco.

Na conexão aérea falei pro marido, que correu pra pegar o seu jornal preferido, disponibilizado gratuitamente pela cia aérea e sentou pra se mimar:

- Vou pegar um café- disse eu.

-Traz um Bretzel?- ele me pediu num impulso (uma espécie de pão bem típico alemão)

E lá fui eu buscar 2 Butterbretzel com Milchkaffee ou o algo similar ao nosso pão com manteiga e café com leite. Bastou a primeira mordida pra ele se sentir chegando em casa.

Entendo bem.

Eu na primeira colherada no meu iogurte preferido de vanila (baunilha) com frutas vermelhas sou teletransportada para este momento de um sabor que já conheço mas que estava adormecido.

E aquele mamão nosso de cada dia no Brasil vai ficando pra trás e logo vai virar saudade.

Ainda chegamos a tempo de aproveitar a temporada dos aspargos brancos que são sinônimo de primavera aqui.

Comemos ontem com batatas novas e molho holandês. Os sabores de cada estação, aqui tem! Coisas que aprendi a gostar aqui e não fazem sentido em outro lugar.

E com certeza, antes que me acostume e chegue de vez, vou rever meus armários. Aqui, lá ou em qualquer lugar.

Lotados do que não me lembro mais.

Bora desapegar sem dor.

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