Pessoal querido, temos uma data: dia 30 de setembro, sábado, na Baldwin Gallery, em Londres será inaugurada a Capitolina Books, uma livraria online (ou com hora marcada) que vai vender e divulgar exclusivamente literatura brasileira contemporânea.
A festa terá música ao vivo, bebida, comida, leitura de fragmentos e alguns dos nossos autores. Uma noite de celebração! Tudo organizado pela Cooknst que vem produzindo festas incríveis na capital. Como é costume inglês planejar tudo com meses de antecedência, coloquem aí nas agendas: 30 de setembro, um sábado. Por enquanto é isso.
E fiquem com os fragmentos de um romance que a Nara Vidal tá escrevendo lá de Londres. Quem sabe vocês não se animam a ir para a inauguração?
" Foi olhando pra uma dessas mesas de toalha pela metade, uma mesa íntima, que a minha mãe anunciou que eu nunca teria filhos. Eu tinha dezesseis anos e minhas ancas doíam do sexo da noite passada. Sentia dor feita de um prazer tão intenso, fortalecido pela memória de fragmentos da noite anterior que, olhando pra ela ao ouvir seu anúncio, eu ri. Gargalhei. Ela logo identificou o demônio em mim, espalhado e à vontade dentro dos meus ossos que sacudiam em riso solto de descontrole.
Dos abortos que eu fiz até meus planos de carreira, ela tinha razão. Não parecia sobrar espaço ou ternura em mim para que eu virasse mãe. É preciso ter espaço pra ser mãe. Ceder espaço no próprio corpo, espaço de tempo, espaço pra abranger e pra proteger.
Eu não tinha essa generosidade em mim. É tanta ternura que ela alarga o corpo. O corpo de uma mãe é um campo fértil e disponível. Desde o início é dela o corpo que recebe, que é fincado, cavado, regado, plantado.
Quando não vinga numa primeira tentativa, é revirado do avesso e de novo, fincado, cavado, regado, plantado até que uma hora gera vida. A vida se extrapola pelo corpo da mãe que parece explodir de tanto desejo. Seu corpo é caminho para a vida. Não importa a trajetória, a vida precisa desaguar no mundo.
O corpo então, se alarga, dói, alaga, abre, rasga, feito a terra, pra trazer vida. Esse mesmo corpo é depois costurado, remendado, estancado, descansado, sugado, desprezado. Em certa hora, vem de novo a vontade da semente. Chove e se refaz: fincado, cavado, regado e plantado. O corpo de uma mãe é feito dessas concessões, desses horrores que se passam por generosidade. Sentada ali na mesa fazendo tal anúncio, ela tinha razão: eu nunca seria mãe.
Venho me esquecendo do meu filho. Até que uma hora será pra sempre.
"Até a minha terra virar deserto" (fragmento: romance)