Eu não sou do Rio. Nasci em Brasília. Sou uma ‘quase-carioca’, se existisse tal título. Minha turma é. E se aboleta cada vez mais debaixo das asas do Cristo Redentor. Tenho mãe, pai, tios e padrasto nascidos no Rio. Nos últimos anos, meus três irmãos resolveram cultivar raízes por lá. Dois são cuiabanos, um é candango que nem eu, e os três curtem demais esse jeitinho carioca de ser. Eu... Estou (sou) do mundo.
Foto: Daniela Paiva
Hoje chamo minha casa de home, e ela fica em Norwich, cravada na região de Norfolk, East Anglia do Reino Unido. Empolgada pelo mestrado e a reviravolta da vida, há dois anos adentrava esse lugar com zero de informação além do Google básico. Até um bom amigo mencionar o time de futebol local como se fosse assim, super óbvio. Sorry, larguei essa paixão faz tempo, sabia nada... Inocente...
E o tempo passou! Tem um monte de história anglo-saxã bacana de Norfolk para fuçar – um castelão bem no meio. Na rabeira, o ponto de ônibus que uso com frequência. Fato é que ainda o conheço apenas pelo lado de fora. E povo pira mesmo nesse lance medieval.
Meu roommate, veja só, é professor e trabalha no castelo ensinando história para a criançada. Nas horas vagas, o que ele faz? Veste uma armadura – de verdade, customizada e para ele – e vai para os campos de batalhar enfrentar outros cavaleiros com espada e armas semelhantes. Agora acabou a desculpa/preguiça. Rembrandt está em cartaz... Troço louco esse negócio de ter um Rembrandt passeando pelo quintal...
Norwich situa-se a duas horas de Londres de trem ou três de ônibus, 40 minutos de trem da praia (se bem que essa parte ainda não me convenceu). Ou seja, estou no interior da Inglaterra, bem diferente da Londres que sempre desejei. É mais árido, difícil de entender, da língua à bronquice. Tudo acaba no mesmo lugar, no Gentleman´s Walk, na beira do mercado coloridinho ou nas entranhas das ruas de pedestre.
Foto: Daniela Paiva
Às vezes sinto Norwich como uma prisão. Cidade sem alma, de muitos vazios. Ao mesmo tempo, de um trânsito incompreensível! Volta e meia bate a pergunta: O que estou fazendo aqui mesmo? Por que raios? É quando vem a solidão ao ar livre no domingo fim de tarde. De repente tudo fecha bum, bum, bum, e às 16h, shhhhhh. Silêncio. Mas a ternura chega. O bucolismo preenche. O humano acalenta. Afago que começa na camadinha de gelo da primavera na grama do Earlham Park do lado de casa, ou na dança de coelhinhos e castores durante o verão. Gosto especialmente de desvendar o canal. Com o tempo a favor, dá para se perder em um dos restaurantes à beira dele, vendo o filmete real de patinhos e pessoas passando....
Certa feita, um grupo de garotas animadinhas tentando pular do bar para o caiaque, naturalmente meio prá, meio pra cá, foi parar na água. Valeu o riso delas - e o nosso. Norwich ostenta o slogan The Fine City. Esse ‘fine’, para mim, puxa para esse lado pomposo, medieval, mas também der um clima gostoso, de cidade fofa. É engraçado como Norwich cresce em você. De repente você está cansada, e uma boa alma te conecta com outra boa alma e novas coisas incríveis parecem prestes a acontecer. Algo te alimenta... E muito!
Os chineses e thais maravilhosos – com uma população estudantil gigantesca de asiáticos, é natural que muitos se estabeleçam, e benza Buda, como tem supermercado especializado deles por aqui! O Les Guarrigues, bodega francesa de queijos e vinhos de Saint Emillion, empreitada de um casal – ele francês, ela inglesa... Conto mais sobre isso na próxima.
Se vou ou se fico, não sei. Só sei que hoje, estou por aqui, em Norwich, Norfolk, East Anglia, Reino Unido!
Foto: Daniela Paiva