... em 8 dias de Roteiro redondinho por terras gaúchas/ Parte3
Bem, nos posts passados falei como eu e marido chegamos ao Uruguai- aqui, para um tour de saindo de Punta del Este, seguindo até a Laguna Gárzon, bem na divisa do departamento de Maldonado- aqui.
Mas como se sai daqui e se vai no Uruguai, de Cabo Polonio até Pelotas, nosso último destino deste primeiro tour por esta banda gauchas? Não há uma estrada litorânea descente que ligue os dois balneários e a solução melhor é voltar à Ruta Interbalnearia, de lá seguir a Ruta 9, chegando em Rocha, próximo departamento (município). E de lá pegar a Ruta 15 pelo litoral e desembocar na Ruta 10 rumo ao Parque Nacional de Cabo Polonio, com uma paradinha para almoçar em La Pedrera, por exemplo. A sinalização é muito boa e nada como um Google Maps para confirmar. Cabo Polonio fica a 85 Km do Chuí e a 268 Km de Montevidéu.
A Puerta del Polonio fica no Km 264,5 da Ruta 10 e é a entrada do Parque mais usada e de fácil acesso. É por ela que a maioria dos viajantes chegam de ônibus, carro ou moto. Se você tiver de carro, como nós, vai precisar estacionar no Parque e pagar em dinheiro, 190 pesos uruguaios a diária (24 horas) a contar da hora que você estacionou. Passar uma noite no povoado era nosso plano. Então seguimos com nossa bagagem ( leve o mínimo,ok?) até a bilheteria e compramos nosso ticket de ida/ volta, embarcamos nos caminhões 4×4 , adaptados às dunas e cruzamos por cerca de 20 minutos o Parque até chegar ao Cabo.
Nós nos penduramos na parte superior do caminhão e se seguimos para atravessar os 7 Km de areia fofa da Puerta até o povoado- emoção com um visual impar, e algum vento.
Alguns moradores utilizam cavalos para chegar a vila que fica cerca de 7 km da estrada na entrada do Parque.
O transporte parte de hora em hora na alta temporada, custa 170 pesos uruguaios em dinheiro, por pessoa e vale para volta. Os horários de saída do parque e da cidade são fixos e é bom retornar calculando o tempo do estacionamento com uma folga para algum imprevisto de travessia. (não esqueça de guardar o seu ticket, senão terá de comprar outro).
Mas todos os solavancos do caminho foram compensados à medida que o caminhão foi saindo do Parque e entrando pela praia rumo a vila, beirando o mar. E eis que, bem lá no fundo, começamos a ver a península, com suas casinhas brancas...
Afinal o que é Cabo Polonio?
Um pequeno paraíso preservado cercado de dunas com um Farol na ponta, uma pequena vila no leste do Uruguai, na costa atlântica, construída numa área protegida que não podem ter mais construções. O povoado é um lugar parado no tempo com ruas de areia, e isso faz Cabo Polonio um lugar muito atraente para quem procura destinos remotos e longe do lugar comum, como nós. Sem luz elétrica regular, wi-fi e com total conexão. A luz é acionada duas vezes por dia e por algumas horas.
Na frente do Farol (de 1881) fica uma das maiores colônias de lobos e leões marinhos do mundo- a Loberia. Me diziam que as praias da região tem um visual selvagem e natureza intacta, fui lá ver. Se o tempo estiver bom, vale a subidas no Farol que tem vista de 360 graus deste pedaço tão especial do mundo. Como estava nublado, não fomos.
Reza a lenda que o pôr-do-sol é maravilhoso de lá e se pode ver bem as playas Norte e Sul do Cabo, com o Farol no meio. Com certeza é um recanto de paz, tranquilidade e…milhares de leões marinhos! O lugar tem um “ar” místico e um pouco hippie...
Assim que fizemos o check in ao entardecer, saímos e em alguns minutinhos de caminhada já estávamos no Farol procurando os lobos "camuflados", nos rochedos. São mais de 300 mil leões marinhos, uma das maiores colônias de todo o mundo.
Onde ficar
A pequena vila é bem animada e com alguns Hostel que atendem um bom número de mochileiros. Não há luxo por lá e as hospedagens são bem modestas – e caras! A que tem uma infraestrutura diferenciada é a Hosteria La Perla del Cabo, e como Hostel não é bem o nosso perfil, ficamos nela. A diária nos saiu por 200 dólares para um casal, com café da manhã completo.
Uma simpática pousada rústica em que cada quarto tem uma varanda debruçada na areia da praia. Quartos bem pequenos mas agradáveis e com banheiro privado, numa localização especial. Bem especial. A pousada possui um gerador próprio que fornece energia elétrica, e para os adictos, internet wifi, do entardecer até às 22:00hs. Passear a noite pela vila depois que os geradores são desligados, e ver as casas e bares com as luzinhas de velas pelo caminho, são de um charme bucólico. Depois é voltar, abrir a porta e dormir com o barulho das ondas do mar.
A pousada tem um bom restaurante também em frente ao mar, com um bom atendimento apesar dos preços altos. Mas vale o momento. Como os quartos são bem escuros quase esquecemos documentos no cofre. É importante levar uma lanterna e ficar atento. Eles só aceitam Cartão Visa pra desconto e pagamentos, nós esquecemos de levar e pagamos com os dólares que tínhamos reservado para uma emergência. Sem desconto, sniff.
Na manhã seguinte, acordamos e depois do café fomos ver os lobos de novo. Com sol lá fora a paisagem é outra.
Voltamos e convencemos o pessoal da pousada a nos deixar sair mais tarde um pouco para podermos dar um mergulho no mar e tomar um banho depois. Não tem um banheiro público com chuveiro pela vila e o check out costuma ser 12h. E nossa volta era às 14h.
Conseguimos e embarcamos pontualmente, mas... O nosso caminhão quebrou no meio do Parque na volta e quase tivemos de pagar mais uma diária de estacionamento. Enfim seguimos de volta até Punta del Este, onde entregamos o carro na locadora às 19h.
Ainda tivemos tempo de deixar as malas na rodoviária e sair pra comer com direito a um churros de sobremesa ,antes de embarcar no ônibus às 22h rumo ao Brasil, parando em Pelotas.
Dormimos rápido e quando percebemos, o sol estava nascendo e nós, chegando em Pelotas. Meio sonolentos ainda, pegamos um taxi:
Incrível com a gente conhece pouco as histórias do nosso país. Ainda não tínhamos digerido o Uruguai e já estávamos seguindo de volta ao passado.
-O que são Charqueadas? – me perguntou o marido
Charqueadas eram um conjunto de fazendas com construções coloniais, às margens do Arroio Pelotas, em que se produziam o charque (carne bovina seca e salgada, onde a carne salgada era exposta em varais para o processo de desidratação), a partir do final do século XIX. Nos Pampas Gaúchos- “terra de ninguém”, os tropeiros conduziam o gado até a foz do Arroio, onde era abatido e a carne transformada em charque em Pelotas-RS. A produção era realizada pelo trabalho escravo e na área viviam as mais ricas e poderosas famílias. O ciclo das Charqueadas começou em 1777 por conta da “seca dos três 7”, no nordeste, quando o fundador de Pelotas- José Pinto Martins se mudou para esta área criando a indústria saladeiril no Rio Grande do Sul.
foto da miniséria "A casa das sete mulheres" reproduzindo os varais com a carne salgada na Charqueada São joão
As Charqueadas, juntamente com o gado, foram a base da economia do Rio Grande. O gado chucro que estava abandonado na região por conta do expulsão dos Jesuítas e massacre dos índios Guaranis da Missões, se procriou imensamente e serviu de matéria prima fácil. O charque foi a base da alimentação dos escravos no Brasil e transformou Pelotas na cidade “capital cultural” do estado. Pelotas chegou a ser uma das mais ricas cidades do país, devido à expansão das Charqueadas, foram 38 fazendas, nos arredores da cidade- 100 anos do início do ciclo.
Reprodução aquarela Debret
Uma nobreza que foi surgindo no séc XVlll E XIX, gerada por carne, sol, sal e sangue, mantida as custas da mão de obra escrava. Cada charqueada possuía, em média, 80 escravos, que tinham seu tempo de vida encurtado pelas condições totalmente insalubres. A capitania do Rio Grande foi considerada o "inferno dos negros", pela forma como os escravos eram tratados.
A população escrava em 1833 era de 5.169, 1.136 libertos e de 3.555 homens livres. A população total era de 10.874 pessoas, sendo 62,1% de negros (51,7% escravos e 10,4% libertos), 36% de brancos e 1,6% de índios. O porcentual de homens e mulheres escravos seria respectivamente 71% e 29% segundo GUTIERREZ, Ester J.B. Negros, charqueadas e olarias: um estudo sobre o espaço pelotense. 2.ed. -Pelotas: Ed. Universitária/UFPEL, 2001
Foram abatidas 45 milhões de reses para a produção do charque que trouxe riqueza para a região. A Charqueadas que restaram , estão abertas à visitação ou hospedagem e hoje são um importante marco turístico da região., cheios de história.
Ufa! História explicada. Escolhi ficar na Charqueada Santa Rita que estava com um preço ótimo e bem vazia antes do Natal. Uma Pousada de charme total construída em 1826, que eu já tinha avisado que faríamos um check in bem mais cedo. Chegamos ás 6h com o sol banhando o Arroio Pelotas e dormimos um pouco. De repente uma chuva começou lá fora.
A ótima pousada de charme e simpatia é uma propriedade muito bem cuidada com quartos amplos e confortáveis. Sentimos falta de uma visita guiada para conhecer mais a história local desta propriedade colonial.
Pelotas, hoje, é a cidade dos doces- trocou o sal pelo açúcar, dizem.
Antes de seguirmos pra dar um giro na cidade e provarmos seus doces, fomos fazer uma visita guia particular na Charqueada vizinha, que foi cenário de filmes e da minissérie “A casa das sete mulheres”. Charqueada São João de 1810 é a única do Ciclo do Charque que mantém as características arquitetônicas originais e que possui um acervo próprio.
Nossa, tantas perguntas e um guia paciente...
Saindo de lá, chamamos um táxi e fomos visitar o centro que fica 7 km dali. É tanta história que até as receitas de cada um dos doces, não escapam de uma pra contar- é só dar um pulo no Museu do doce pra conhecer. Comer os tradicionais doces em Pelotas faz parte dos roteiros turisticos do país. O forte são os doces portugueses – herança do Ciclo das Charqueadas.
Almoçamos no Mercado público e é claro comemos um quindim e um bem casado na Imperatriz doces finos. Aproveitei e rodei a cidade atrás de um doce de infância- chimia de uva das colônias- e acheiiii.
Partimos no dia seguinte, num ônibus pra POA ( Porto Alegre) que nos deixou “ dentro” do aeroporto. Embarcamos pro Rio terminando esta viagem por este, que é o mais "gaúcho dos universos". Depois deste tour pelo Uruguai com direito a um mergulho na história dos Pampas, deu pra ter um belo panorama desta cultura e tradição. E de quebra trouxemos uma mala repleta de histórias, fotos, vinhos, doces de leite e...chimia.
Foi nossa forma de continuar saboreando esta viagem primeira viagem ao Uruguai, seguindo de Montevideo para José Ignacio. E de lá até até Cabo Polonio, e para Pelotas, que só agora acabei de digerir, Tchê. Bemmm devagarinho...
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