20 de Abril de 2018. 9 meses de regresso inesperado ao título de moradora do Rio.
9 meses…
Tempo para uma vida humana nascer.
Tempo que levei para renascer: desconstruindo ideias sobre a minha própria história, minha autoimagem dentro do que eu imaginava poder alcançar profissionalmente dentro do meu país.
"A vida como ela é", diria Nelson Rodrigues. Autor o qual sempre admirei por embelezar o cinismo e a ironia da vida.
Eu ainda oscilo entre o arrebatamento colossal da beleza dela e a leve sensação de uma síndrome de perseguição que ela tem comigo.
Talvez seja apenas um ponto de vista. A minha percepção. Sendo assim, minha verdade.
Desde que voltei do México, fui lançada a desafios onde nunca me sentia no mesmo patamar dos meus colegas de trabalho. Não em relação a talento ou potencial, mas injustamente colocada sem uma preparação, sem um trabalho prévio como todos os outros ao meu redor tiveram a chance de ter.
Entrei de gaiato no meio de uma novela em curso, onde todos já tinham encontrado seus personagens, o tom de seu respectivo núcleo, haviam experimentado um trabalho de laboratório prévio, meses antes de sequer pisar no set.
Eu não. E por isso, tenho sempre a sensação de ser obrigada a correr mais atrás para alcançar o nível dos que viveram o processo desde o inicio.
Esta sensação de inadequação já havia começado no México, quando entendi que, para trabalhar lá como atriz, ou mesmo num comercial com texto, eu teria que neutralizar o meu sotaque.
Falar espanhol fluente e minha bagagem profissional nunca me foram suficientes, então já aí, me via numa situação de não poder enfrentar uma competição justa com as demais atrizes e modelos locais.
Até que, uau! Começam a me confundir com uma mexicana quando falo! Mas em seguida a vida me traz para o Brasil com a propaganda enganosa de que seria por apenas 15 dias.
Venho, entro no meio de uma novela de sucesso, tento de todas as maneiras construir em tempo record, uma personagem de um universo distante do meu e quando estou perto de encontra-la, a novela acaba. Coito interrompido pra quem pega o bonde andando.
Foto Blad Meneghel
Em seguida, sou convidada, uma proposta tentadora, de participar de um reality onde o premio é de 500 mil reais e o jogo é uma competição de dança de salão.
Eu, que não costumo fazer desfeita, aceito o convite, mesmo sem um passado na dança.
Sou a penúltima participante a ser escalada nos 45 do segundo tempo, e vou ao encontro dos meus “rivais” num workshop de 5 dias e que acabo chegando apenas no terceiro, por conta da demora da contratação.
Me deparo com a intimidades entre todos ali e de alguns poucos absurdamente conectados com uma vocação pra dança.
Nem preciso dizer o quanto padeci no processo, onde na prática tínhamos uma vida de atleta. 4hs de ensaios diários. Uma coreografia por semana com musicas que propositalmente não combinavam com o ritmo proposto. Estafa física e mental, me expondo numa fragilidade de algo que não domino em rede nacional. Abrindo espaço para um júri que não sabe da minha história e que não esta ali para amenizar nada.
Choro. Sentindo toda a minha incapacidade de dar aquilo que esperam de mim e que ainda não tenho para ofertar. Aquilo que não tive tempo de estudar.
Foto Blad Meneghel
Seria cômico se não fosse minimamente. curioso. Ainda no programa, surge a oportunidade de pela primeira vez estar num projeto de uma série como protagonista!
Na argentina. Falando castelhano.
Nem preciso dizer que também não tive tempo de preparação, laboratório para uma personagem que é o fio condutor de toda uma estória. E também não preciso dizer que enfrentei na raça e sozinha o desafio de atuar num idioma que não tem nada a ver com o sotaque neutralizado que eu havia estudado no México.
Por sorte ou poesia, eu me jogo. E sempre sobrevivo.
Talvez por isso enfrento o meu medo do que estar por vir com a serenidade de que, independente do que seja, eu vou dar conta. Tenho que. Como sempre fiz.
O tal papo de que “o que não te mata, só te fortalece.” talvez seja verdade.
Enquanto curo minhas lesões musculares de um programa de dança, no qual acabei me destacando (pasmem!) como uma das favoritas, vou para os braços do meu amado esperando que sua cidade me presenteie para além das empanadas e bons vinhos, o que está inerente em seu nome: Buenos Aires…