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Foto do escritorDo Rio pra cá

Um ser num mundo de mudanças

Atualizado: 12 de out. de 2019


É um desafio para mim escrever, não tanto pela combinação das palavras ou a organização das ideias em orações que tracem um sentido exato do que vem de dentro. Mas pela responsabilidade que é materializar no mundo aquilo que até então encontro reservado no silêncio dos pensamentos, nas nuvens interiores que moldo ao sabor das transformações e que por estarem dentro só a mim afetam, ocupam ou impactam. Sou um ser num mundo de mudanças...

Mundo de mudanças e a minha Bahia

Porém, faz algum tempo que fui carinhosamente convidada a cumprir a missão de falar sobre este ato de se tornar estrangeiro, de deliberadamente (ou não) escolher cruzar fronteiras desconhecidas e construir um novo mundo de sonhos, distante de tudo aquilo que nos é familiar, confortável e seguro.

Nunca soube definir se as minhas mudanças foram escolhas ou determinações de outros tempos, se fazem parte daquilo que em árabe chamam de “Maktub” - estava escrito. Só sei que fui, que todas as vezes que senti o vento soprar em alguma direção assumi o risco de me aventurar a enorme descoberta de um novo eu que brotaria de um novo lugar. E tem sido bom, embora nem sempre fácil.

Eu, Luana Bistane, neste mundo em mudanças

Sou nascida em Ribeirão Preto, mas meus anos em terras brasilisse dividiram entre Belo Horizonte, São Paulo e Salvador. Esta última cidade, Salvador da Bahia, foi de todas, o meu primeiro desejo de mudança, de pertencimento, uma das minhas maiores conquistas e realizações, é a casa da minha alma, e de onde tive mais dificuldade para partir.

A Bahia me fez entender a relatividade do tempo, a força que tem a empatia, o acolhimento, a amizade. Moldou em mim a capacidade de ser resiliente, abriu meus braços e me transformou em alguém mais doce e humana, e justamente por isso também mais forte e capaz de enfrentar toda brutalidade do mundo.

Mudando e vivendo pelo mundo

Foi lá meu trampolim, o salto mais alto, foi sentada a beira mar, na Bahia de Todos os Santos, que enxerguei no lado norte do Atlântico um novo porto, uma nova vontade de ser outra que ainda nem sabia viria a se materializar.

Curioso, hoje, quando coloco os pés nas águas geladas do agitado mar de Portugal, que olhando no horizonte ainda posso ver sentada nas águas doces e quentes da Bahia, uma Luana que certamente ainda existe em algum espaço tempo dentro de mim, mas que a muito tomou formas inimagináveis.

O ser que me torno a cada volta do mundo

Percorri estradas que me levaram a Espanha, me fixei em Madrid e aprendi a amar uma terra seca, árida e dura, absolutamente o oposto da minha Salvador que em tudo era afeto. Tive dificuldade em conseguir casa, em entender a língua, em lidar com a forma as vezes rude dos espanhóis, passei uma semana sendo acolhida por uma colombiana querida. Reconheci o quanto deveríamos estar mais próximos aos nossos Hermanossul americanos. Odiei a comida até me abrir de fato aos sabores de uma gastronomia que reflete a força daquele povo. Duvidei, questionei, entendi.

Me especializei em Economia Criativa, desenhei o projeto de uma empresa, abri uma empresa, ganhei prêmios, absorvi o máximo de conhecimento que podia, e ainda assim tive – e ainda tenho – medo de que ao norte do globo eu precise eternamente provar que mereço os espaços conquistados.

Um mar de saudades me separa da Bahia

Esse mês, completo um ano e seis meses em Lisboa, Portugal. Talvez, inconscientemente, tenha escolhido uma cidade que pudesse me fazer sentir mais próxima da Bahia. Portugal tem sido boa para mim, a cidade que vivo é feita de luz e poesia, os amigos chegaram mais facilmente, tem tapioca, guaraná e muita música brasileira. Tem também o “jeitinho brasileiro”, que cada vez mais entendo de onde ele veio. Falamos a mesma língua, embora definitivamente não falemos a “mesma” língua, é difícil explicar.

Luana Bistane em Portugal

De tanto mudar, a mala foi ficando cada vez mais cheia de saudades e menos carregada de coisas, objetos, peso. Vamos entendendo que andar mais leve torna tudo mais fácil, e que na realidade o que precisamos mesmo é de um abraço apertado nas chegadas, e a certeza dos amores nas partidas.

Um olhar para este mundo

Quanto mais eu caminho, mais entendo que sei ainda menos que achava que sabia. É tão vasto o mundo, e é tão rico de possibilidades, e a vida que nos é dada é, sem dúvidas, uma escola para nos tornarmos o melhor que podemos ser. Eu venho buscando isso.

Por hora fico por aqui, escrevo de um ônibus que me leva novamente a minha cidade natal, Ribeirão Preto, vai terminando a viagem e é hora de encontrar um dos abraços mais apertados na minha vida, meu pai. Vou me preparar para isso, porque neste mesmo dia deixei um dos grandes amores, minha mãe. E afinal de contas, chegar e partir não é assim tão fácil e requer preparo, e muito peito aberto.

Luana Bistane

LuanaBistane-Formada em Comunicação e Produção em Cultura pela UFBA e mestre em Gestão em Economia Criativa pela URJC- Madrid. Luana Bistane é curiosa e investigadora na área de desenvolvimento através da Economia da Cultura e Criativa. Atualmente é "business developer" da startup Brigde For Billions e Co-founder e Diretora Criativa da LadoBe Creative Agency. Com a LadoBe promove inovação e internacionalização de empresas, branding cultural e projetos culturais e criativos. Com larga experiência em políticas publicas de Cultura, foi Diretora Executiva da Orquestra Sinfônica da Bahia por quatro anos, quando acompanhou Gilberto Gil, na turnê do show "Concerto de cordas e Máquinas de Ritmos.

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