Polônia... Quem diria que um dia eu aqui estaria, mesmo você estando na minha vida a tanto tempo.
Ouvia falar desse país de povo sofrido e tão forte, que tanto lutou para se reerguer.
Este país que ficou por 123 anos fora do mapa, mas este povo perseverante e patriota, lutou para que sua cultura e história não fossem esquecidas jamais. Este país que eu tanto ouvia histórias desde pequena.
Nasci e cresci no estado do Paraná. Curitibana, descendente de poloneses.
Durante as férias quando criança, era em Cruz Machado, cidade no sul do Paraná, era o local onde eu mais tinha contato com a cultura e idioma polonês, quando passava dias na casa dos meus avós.
Hoje, muitos anos depois, a vida preparou tudo e cá estou, morando em Cracóvia, cidade no sul da Polônia, com meu marido e nossos três filhos: Camila, 17 anos, Emanuel 10 e Monique 5.
Photo by Deborah Mulazani
O fator principal passa nossa mudança para a Polônia foi uma tentativa de assalto em nossa casa, em março de 2016.
Alex, meu esposo, foi abordado no portão de casa por dois assaltantes armados.
Meu marido fez o que nunca devemos fazer: ele reagiu para nos proteger.
Foi com certeza a pior experiência e sensação das nossas vidas e depois daquele dia, nada mais foi igual. A insegurança e o medo agora eram nítidos em todos nós.
Como eu e meu marido somos descendentes de poloneses, fomos atrás do processo de cidadania. Assim que a documentação ficou pronta, ele que é da área de TI, começou a aplicar seu CV para vagas para a Polônia e em dezembro de 2017, foi selecionado e passou num processo seletivo.
Ele veio pra cá em janeiro e eu com as crianças apenas em julho de 2018, pois ainda tinham assuntos no Brasil a serem resolvidos, venda de carro, as coisas de casa, enfim, preferimos que ele viesse na frente, uma vez também que em janeiro já era inverno aqui na Europa e preferimos esperar uma estação mais amena para mudar com as crianças.
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Chegando aqui, tudo parecia tão mágico. Essa cidade tão diferente de tudo o que já vi. Seu estilo medieval, me ganhou desde o primeiro passeio nas ruas.
Chegando aqui em julho, era verão e férias escolares. Aqui o ano letivo tem início em setembro e como era calor nessa época, passeamos muito com as crianças. Eu estava apaixonada por tudo o que via! O centro da cidade, a arquitetura, os prédios antigos, as praças históricas, parques, os museus.
Meu primeiro contato com lugares onde o povo judeu tanto sofreu, a Fábrica de Oscar Schindler, eu jamais vou esquecer quando entrei a primeira vez.
Essa cidade, este país, me faz sentir tanta coisa que as vezes é difícil descrever em palavras. Eu simplesmente amo morar aqui. As vezes sinto que estou aqui a tanto tempo, mesmo sendo apenas seis meses.
O idioma é uma das línguas mais difíceis do mundo. Estudo desde julho de 2017 e me viro bem por aqui no polonês.
No início, obviamente não foi fácil, as crianças estudam em escola pública, o que não oferece a opção em inglês. Eles foram com a cara e a coragem e hoje, mesmo em tão pouco tempo, já sabem falar e se virar com a língua. Dos meus três filhos, dois frequentam a escola: Emanuel está no quinto ano e Monique, numa turma que seria como o pré do Brasil. Camila que tem 17 anos, é portadora de paralisia cerebral e não frequenta escola aqui. Ela possui múltiplas deficiências, devido a um acidente no parto.
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E já no primeiro semestre aqui, passamos um susto envolvendo a saúde dela. Aqui descobrimos um problema cardíaco que a deixou no hospital por 18 dias. Foi tenso... Estar num país onde o idioma é difícil, tendo que lidar com assuntos relacionados a saúde, contar com pessoas que até pouco tempo você nunca imaginou que existiam, mas que na dor te mostraram ser agora a sua família, foi o que me deu muita força. E estamos seguindo, vivendo um dia de cada vez.
A Polônia é um país que me surpreendeu positivamente em relação a saúde da minha filha e quero poder viver aqui por muito e muito tempo! Não seria exagero dizer para sempre e este é o desejo dos meus filhos e do meu esposo.
Gosto da segurança, da sensação de não sentir medo.
Poder ir e vir, seja a hora que for, em paz e com tranquilidade. Aquela segurança em sair e ninguém roubar seu celular ou sua bolsa, seja dia ou noite.
Gosto da limpeza local, dos monumentos.
Aqui a mulher é respeitada seja lá como estiver vestida.
Ouvia muito dizer que o povo polonês é mais fechados. Nunca tive problema com isso e acho até que tenho levado sorte. Os poloneses são simpáticos comigo.
Mas de tudo mesmo o que mais me apaixonei aqui, foi a liberdade que meus filhos têm. Eles brincam muito aqui, coisa que no Brasil não era assim. Viviam enfiados em casa, brincavam pouco lá fora, principalmente depois do fato que descrevi no início, do dia que meu esposo reagiu ao assalto. Eles tinham muito medo, principalmente meu filho de dez anos.
Photo by Deborah Mulazani
Aqui eles ficam soltos no condomínio, brincam de bicicleta, bola, roller, patinete, no campinho, na areia, com bolinha de sabão e agora no inverno, se divertem com a neve. Ao ar livre e seguros.
As vezes bate uma saudade de algumas pessoas do Brasil, família e alguns amigos. Viva a internet e as redes sociais que dão a impressão de deixar a distância menor.
Ah, se pudéssemos trazer na mala aqueles que a gente ama...
Quando conto para a família que aqui não trancamos o apartamento pra nada, parece que estamos falando de outro mundo. Essa segurança não tem preço. É o que mais gosto daqui. A sensação de liberdade.
E se eu pudesse dar um conselho a quem assim como nós, pensa em mudar de país, diria para estudar sobre o local, se dedicar ao idioma, a aprender, a conhecer a cultura local. Fazer todas as perguntas possíveis, a internet está aí e existem vários grupos de brasileiros em qualquer lugar dos quatro cantos do mundo.
Eu estudei muito essa nossa mudança, pois não viria sozinha ou apenas com meu esposo. Envolvia a vida de três crianças, sendo uma especial.
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Eu pensava em como seria a viagem, pois é muito longa.
Minha filha se alimenta por sonda, usa fraldas, não anda e não fala e eu pensava em como seria numa possível emergência, fosse no vôo ou logo que chegasse.
Procurei pelas respostas as minhas perguntas e mesmo assim tantas outras surgiram aqui!
Mas no dia a dia a gente aprende e muito quando sai da nossa zona de conforto. A gente cresce e amadurece e junto a minha vida, estava o que de mais valioso eu tenho: meus filhos, minha família!
Era meu dever fazer com que tudo desse absolutamente certo!
Construam laços, façam amizades, troquem experiências.
Hoje convivo com pessoas que a 1 ano atrás meu contato era apenas virtual.
E das escolhas que fiz, das oportunidades que a vida me deu, das mudanças, sejam elas geográficas ou mudanças consigo mesmo, de nada me arrependi até aqui.
Foi fácil? Te digo que não!
Foi tudo difícil? Não também. Eu seria injusta, pois muita coisa aqui tem dado super certo.
O que sei é que não dá para se arrepender de algo que não se tente, não se arrisque.
E eu, e nós, decidimos aceitar aquilo que o universo dizia sermos capazes.
E cá estamos. As vezes sorrindo, tantas outras vezes chorando. Mas seguindo. A Polônia entrou na minha vida., para ficar.
Siga você também e se permita arriscar, pois intentar é viver! Você só saberá se é para ser, se for e fazer.
E sempre frizo: se eu com meus filhos, a condição especial da minha filha, consigo, você conseguirá MUITO e muito mais!
Vá!
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Valéria Rodrigues tem 39 anos; de origem polonesa, nascida em Curitiba - Paraná e mora em Cracóvia na Polônia. Casada, mãe de três filhos, tem paixão por livros, escrita e história.