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Foto do escritornaravidal

Nadar com brincos de princesa em Santa Teresa, Rio de Janeiro


Uma das estranhas memórias que eu tenho é de, aos 5 anos, ir à casa de uma conhecida da minha mãe e me deparar com um espaço diferente daquele das casas dos meus parentes e até a minha própria.


As casas onde eu cresci sempre tiveram um conceito estranho de casa. Havia sempre uma sala de visitas que ninguém usava, que era intocável e intocada, apenas para estranhos e formalidades. Era considerado o melhor espaço da casa e ainda assim, para receber visitas e se sentir sobre regras de etiqueta. Quando relembro esse conceito, penso no teor repressor que as casas têm ou tiveram.


A casa da amiga da minha mãe era muito diferente daquilo tudo com o qual eu estava acostumada. Havia uma área de plantas com poltronas acolchoadas, ao ar livre, havia um aparelho de som e até um espelho, nessa espécie de jardim acimentado.


Dentro, na sala de visitas onde ela nos recebeu, dois sofás muito confortáveis e que, claramente, eram usados pela dona da casa. Estantes de livros e discos, almofadas pelo chão, onde me sentei e cores, muitas, algo que também contrastava com a sobriedade dos espaços de visita feitos de móveis antigos, em mogno, encerados e desconfortáveis.

Avançamos quarenta e três anos e estou numa sala que me faz pensar nessa casa que visitei aos cinco. Talvez a palavra charme venha pra mim associada à palavra conforto, à informalidade, ao termo laissez faire. Aliás, boa expressão para caracterizar esse espaço que é o Villa Paranaguá, localizado entre a Lapa e Santa Teresa, num local de charme absoluto porque ainda é um charme cru.


Um lugar afrancesado e muito carioca, cuja propriedade foi comprada por uma família francesa com ligação afetiva de décadas com o Rio de Janeiro. Joachim, um dos proprietários, me contou com imenso entusiasmo sobre a casa, a relação que nutre com o Brasil desde pequeno, e o projeto de transformar a casa que, um dia, foi de Tônia Carrero, no hotel spa que Villa Paranaguá se tornou.

O jeito chic e despojado é um deslumbre. Acredito que seja esse o melhor conceito de luxo, mas vou mais longe porque eles foram: há algo de muito especial no lugar que é o destaque dado a elementos locais, desde frutas e plantas à madeira utilizada e preservada no entorno. Além disso, me contou Joachim, que vários objetos e móveis que povoam o espaço, foram feitos à mão por ele e seu pai. É um projeto de família, ainda inacabado e cheio de potencial. É também um projeto de amor pelo Rio e suas peculiaridades.

A sala que tanto me impactou é a entrada do hotel. Um lugar onde vejo encontros entre artistas, discussões interessantes e apaixonadas, música, livros, muitas obras de arte, já que os proprietários são, também, colecionadores.

Há vários ambientes: uma biblioteca com uma mesa para os hóspedes se debruçarem enquanto exploram os títulos da linda estante; uma mesa de jantar; um canto com uma chaise longue debaixo de uma janela que quase cobre toda a parede; os sofás e sobre o principal, uma pintura gigantesca de Tônia Carrero que fugiu para essa casa em Santa Teresa para encenar peças que a ditadura não deixava, lá na Zona Sul.


Há inúmeras características no Villa Paranaguá e é possível passar o dia só descobrindo detalhes e charmes surpreendentes na propriedade. Vou dar um destaque à piscina. Eu sou louca por piscinas. Desde criança tenho sonhos com piscinas. A do Villa é especial porque dialoga com folhagens tropicais e a suave brisa faz cair na água brincos de princesa cor de rosa. Numa manhã, enquanto nadava, vi ao meu entorno, pontilhados cor de rosa sob a luz do Rio e eu sozinha no topo do mundo que é Santa Teresa. Eis um momento desses de guardar nas caixas forradas de seda da memória.

Quando escrevo sobre hotéis, não é frequente, mas pode acontecer de ser dado a mim um quarto comum ou mais econômico. Isso é sempre um equívoco porque alguém que vai escrever sobre uma experiência, precisa tê-la. Foi dado a mim, no Villa Paranaguá, o melhor quarto possível. Nenhuma fotografia fará justiça aos espaços, às obras de arte, mas é mesmo especial ir tomar banho numa banheira cuja janela emoldura a vista da Mata Atlântica e a ponta do Pão de Açúcar. Não bastasse a beleza do banheiro de tirar o fôlego, o quarto de decoração sofisticadamente informal traduz o conceito de conforto da casa. Para arrematar, uma varanda espaçosa com vista para a marina e partes de Pão de Açúcar, infelizmente escondido, parcialmente, por um velho prédio dos tempos em que progresso significava concreto.

Minha sugestão para quem se hospedar no Villa Paranaguá é ir com tempo. Tempo para provar as comidas deliciosas feitas por brasileiros e franceses, sempre juntos no conceito do hotel, e tempo para repetir todos os dias um dos melhores cafés da manhã que já experimentei. Pain au chocolate fresco, pequenos bolinhos de laranja e o delicioso cannelés são algumas das delícias servidas diariamente com ovos mexidos e uma salada de frutas tropicais e flores que é uma explosão de cor e sabor. Água de coco, suco fresco de laranja, maracujá e granola também são servidos.

O espaço é também um spa que, infelizmente, não experimentei. Mas posso palpitar que seja altamente recomendável, se tivermos por base a generosidade dos serviços e espaço.

Um dia, um funcionário do hotel, ao trazer um copo de vinho branco na piscina pra mim, avisou da possível chuva. Chuva tropical, quente. Torci para que o vento espalhasse aquilo. Os deuses me ouviram e passei o resto da tarde entre brincos de princesa, memórias de casas e espaços futuros que ainda quero criar. Sempre lá no topo do mundo que é Santa Teresa.


Rua Visconde de Paranaguá, 71 - Santa Teresa

Rio de Janeiro, RJ – Brasil

Tel. +55 21 3596 7020

Preço médio da diária: R$1.700,00


Fotos: Acervo Pessoal


Nara Vidal é mineira de Guarani. Uma das fundadoras do"Do Rio Pra cá". Formada em Letras pela UFRJ e Mestre em Artes pela London Met University, é escritora, tradutora, professora e editora. Nara já publicou vários infantis e livros de contos. Foi ganhadora do prêmio "Maximiano Campos" na categoria conto e do Brazilian Press Awards pelo seu trabalho com literatura infantil. Mora na Inglaterra desde 2001. “Sorte" (Editora Moinhos, 2018) é seu romance vencedor do Prêmio Oceanos. É editora da revista literária Capitolina, que lhe rendeu um prêmio APCA em 2021 e colaboradora de várias publicações, como a revista Quatro Cinco Um, além de colunista dos jornais Tribuna de Minas e Rascunho.


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