"Quando vai vacinar", perguntou meu pai ansioso na segunda-feira um dia antes de ter início o processo de vacinação aqui no Reino Unido, que saiu na frente no Ocidente na etapa de combate ao Covid-19.
Fui olhar a programação que foi montada de acordo com idade e condições de saúde. Minha faixa etária nem sequer aparece na lista. A vacinação começou com idosos acima de 80 anos e trabalhadores na linha de frente de saúde dos hospitais e asilos.
A rainha Elizabeth aos 94 e o Duque de Edimburgo aos 99 anos estão entre os que receberam as primeiras picadinhas. No entanto, o noticiário privilegiou o cidadão comum. E, estampou a foto e a história de Margaret Keenan, 90 anos, pioneira da vacinação de Coventry, cidade a mais ou menos 150km de Londres.
A idosa disse que espera rever família e amigos até a virada do ano. "Sou uma privilegiada", disse a senhora simpática. A vacina exige duas aplicações com um intervalo de 21 dias.
Por esses dias, conversei com um amigo que faz parte do grupo de teste da Novavax, a terceira na lista de vacinas mais cotadas para o Reino Unido, e que a princípio tem um tiquinho maior de eficácia do que a da Pfizer/BionTech.
Ele está na segunda dose. Pode ter tomado o placebo ou a vacina mesmo. Relatou apenas uma pequena dor de cabeça após a aplicação. Para ele, pouco importa a marca da vacina, desde que alguma esteja disponível e em ação. Robert é chef e dançarino. Seus dois ofícios precisam de público, de gente, de alegria, de tê tê tê.
O Governo encomendou 40 milhões de doses da vacina e inicia essa fase com 800 mil pessoas.
Entre elas estão as que de fora das linhas de risco, como os jovens ou nem-tão-jovens, como eu.
A esperança gira em torno das chances de uma primavera e/ou verão “normais” com os setores de bares e restaurantes e da indústria de entretenimento retomando as atividades.
Essa segunda fase de isolamento não foi (e, não está sendo) fácil. Há um cansaço geral por conta da falta de socialização e de lazer fora do mundo Netflix, das festinhas de Zoom e das aventuras manuais no lar doce lar.
Por aqui, o calor representa muita coisa. É quando os ingleses literalmente soltam tudo aquilo que está entalado historicamente neles, como a distância social natural, a dificuldade do toque. Brasileiros, latinos em geral, italianos e nacionalidades mais quentes fazem transbordar todo o seu calor humano. Tudo isso ficou truncado nesse verão.
Com a chegada do inverno e a noite surgindo às 4 da tarde, a ausência de luz parece ainda mais dura. As ruas vazias e úmidas estão mais silenciosas e tristes bem diferentes do velho normal. O desespero levou a população a correr para as lojas no fim de semana com a redução das restrições.
O autocuidado, que foi o melhor amigo na fase crítica de lockdown, também dá sinais de esgotamento. Haja yoga e meditação ao longo de tantas horas de céu escuro.
As incertezas tornam o cenário otimista para o ano de 2021, mas ainda está um pouco difícil de ser visualizado. Não se sabe quanto tempo dura a imunização, por exemplo. Uma das questões é sobre a obrigatoriedade do cartão de vacinação. O Governo anunciou que não fará exigências sobre ele.
Lembra da época que só se podia viajar com a vacina da febre amarela? Em tempos de Covid-19, uma cena imaginável seria a de reservas para mesas em restaurantes aceitas apenas mediante a comprovação da vacinação ao apresentar o cartão. Ai, que difícil, né?
Em 2019, comprei ingresso para um show do Nick Cave (artista australiano que se apresentou no Brasil em 2019) marcado para 2020 e consequentemente remarcado para 2021. Esta semana, recebi e-mail anunciando cancelamento por completo. Ou seja, nada feito para a possibilidade de um show para imunizados. Fica para um outro momento. E, vamos que vamos.
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